Sobre experiência estética John Dewey (2010) fala poeticamente: “(…)pela arte somos levados a além de nós mesmos. A fim de encontrarmos a nós mesmos”. Segundo a filosofia de Dewey, o processo artístico pode ser comparado com um processo orgânico. Luigi Pareyson já dizia que a filosofia de Dewey é uma filosofia da operosidade humana, mostrando que através de uma trajetória de gestação, incubação, nascimento, crescimento e maturação, se chega à obra de arte. A arte como um dos últimos espaços possíveis da experiência intensa, verdadeira e profunda dos sujeitos, permanece na história e acontece em um tempo só: no aqui-e-agora.
O compartilhamento de sentidos com outro, uma escuta real e atenta que transforma vivência em experiência, é quase uma raridade na atualidade. Ainda refletindo sobre a experiência, Claudio Montoto (2013) no seu artigo “Como Matamos a Experiência”, considera que a tendência atual dos sujeitos se determina pela “vivência”: fazer uma infinidade de coisas, ocupar o máximo possível as horas do dia com tarefas e compromissos, conectar-se de forma superficial e acelerada com um número enorme de pessoas. E essa dinâmica existencial acelerada e veloz, de um tempo sempre insuficiente, acaba se sobrepondo ao sentido da “experiência”, somente possível no presente. Vive-se, assim, correndo atrás do tempo, mas ele é justamente aquilo que mais falta: o tempo que vale a pena ser vivido. Esse tempo pertence ao “tempo da experiência”, que só pode estar no presente.
Adentrar no mundo das artes incentiva o aprofundamento de estudos sobre psicanálise em um diálogo constante com o universo da criação artística e, claro, da experiência. O ator, diretor e fundador do Teatro de Arte de Moscou (TAM), Constantin Stanislavski (1863-1938) expressa: “Aprendam a amar a arte em vocês mesmos, e não vocês mesmo na arte”.
Assim, não apenas a experiência estética propicia esse encontro, mas amar a arte em nós mesmos parece ser possível na clínica da cultura psicanalítica, lugar do discurso, do Inconsciente e, por que não, da poesia? Trazendo à tona novos sentidos existenciais para os sujeitos, um processo constante (re)criação e (re)significação se “presentifica” na experiência.
Fernanda Fazzio é psicóloga, psicanalista e escritora (www.fernandafazzio.com.br)
Bibliografia consultada
DEWEY, J; A arte como experiência; São Paulo: editora Martins Fontes; 2010.
FREUD, Sigmund (1856-1939); Obras Psicológicas de Sigmund Freud: edição standard brasileira/ Sigmund Freud; com comentários e notas de James Strachey; em colaboração com Anna Freud; assistidos por Alix Strachey e Alan Tyson; traduzido do alemão e do inglês sob a direção geral de Salomão- Rio de Janeiro: Imago, 1996.
FREUD, Sigmund (1856-1939); Obras Completas. Tradução de Paulo Cesar de Souza; São Paulo: Companhia das Letras, 2010.
SANTAELLA, L; HISGAIL, F (org); Semiótica Psicanalítica: clínica da cultura; São Paulo: editora Psicanálise; 2014.
STANISLAVSKI, C; A Preparação do ator. São Paulo: Civilização Brasileira; 2014.
WINNICOTT, D; O brincar e a realidade; Rio de Janeiro: Imago